Um pouco mais distante do acontecimento que marcou a semana mundial que ocorreu em Paris, penso conseguir ter uma opinião menos acalorada sobre o que de facto se passou.
É óbvio que este acontecimento não é, de todo, um caso isolado. É um acontecimento que vem na sequência de muitos outros. Todos eles, isoladamente, podem ser vistos como inocentes. Contudo, se todos somados, pode começar a pensar-se numa bola de neve que pode vir a ter proporções algo graves.
É óbvio que o que os atacantes querem é que se sinta medo. E daí atacaram, sem dó, os seus principais críticos. E sem aviso. E no centro do multiculturalismo. França é o centro do multiculturalismo, onde a religião islâmica tem uma presença significativa.
Todos sabemos que a revista em causa era um "bastião" da liberdade de expressão. Criticava tudo o que entendia criticar, de forma mordaz, através de caricaturas, ao abrigo de algo que definiam como "liberdade de expressão". E daí, criticavam tudo. Criticaram, também Maomé. Ora, para os islamitas, Maomé é uma peça sagrada na sua religião, o que faz com que tenham criticado uma personagem que lhes diz muito.
Até aqui nada de novo. Qualquer um poderia dizer que, se se criticasse Jesus Cristo, não seria provável que acontecesse algo de similar. Pois não. Mas estamos a esquecer algo que é importante. O meio onde se insere o Islão. Meio pobre e ditatorial, propício a que apareçam interpretações mais extremistas do Corão, o que pode levar a atitudes extremas, como estas, ao contrário do cristianismo. Por outro lado, nos meios menos extremistas, não existe vontade em combater estes extremismos. Aliás, o mundo depende do equilíbrio que foi sendo feito, no sentido de evitar uma guerra fracticida no Médio Oriente. Deste modo, propagou-se fortemente uma interpretação mais extrema do Corão, que começa a ganhar força à medida que organizações como o "Estado Islâmico" ganham força.
A minha professora de Filosofia, numa das primeiras aulas, disse uma frase que me marcou daí em diante e que me irá marcar na minha vida. "A minha liberdade acaba onde começa a liberdade do outro". Ora, os Islamitas poderão sempre argumentar que, se ao abrigo da liberdade de expressão, tiveram a liberdade de criticar algo que lhes é muito querido, eles também poderiam ter a liberdade de atacar esses críticos, ainda que eles tivessem a melhor das intenções.
Por outro lado, convém não esquecermos a História. Em 1436 (que é a correspondência do "nosso" 2015 para a era muçulmana), tínhamos acabado de matar muita gente pela conquista de Ceuta, que aliás, não rendeu assim grande coisa. Estávamos a pensar em progredir Africa abaixo, e a matar muita gente, quer pela fé, quer pelo domínio económico. Pelo que não podemos esquecer que os Muçulmanos ainda têm o mesmo problema. Foi a mesma Igreja Católica que, em nome da fé, negou o conhecimento científico produzido por Galileu. É esta interpretação do Corão que faz com que muitos matem para divulgar a fé, impondo-a, como nós também fizemos no passado, ao resto do Mundo.
Estamos então face a um dilema que é preciso equilibrar. O da liberdade. Afinal o mais difícil de satisfazer, porque há sempre gente que é atingida. Soluções? Não tenho. E não deve haver. Pelo menos das que sejam lógicas e não-ditatoriais. Agora, o que é certo é que, depois desta euforia do "somos todos Charlie" vai haver muita gente que vai deixar de o ser (na atitude, claro!) porque vai ter medo pela própria vida.
Deixo para o fim aquilo que me parece mais grave e que não vi ser discutido nas Televisões. O que fazer para evitar estes casos em Portugal. Este ataque não foi um ataque voluntarioso, ao estilo dos bombistas suicidas tradicionais. Este foi um ataque militar, com todas as técnicas, antes, durante e depois (principalmente este depois), inerentes a um ataque militar. Não nos podemos esquecer dos campos de treino, que são cada vez melhores, que são criados por aqueles lados. A maior parte até financiados por países do primeiro mundo, como os EUA ou a Rússia, no sentido de proteger os seus interesses, o que parece que lhes pode sair mais caro um dia destes. O que será que se pode fazer em Portugal para que isto não aconteça? Que medidas se deverão tomar para não incentivar este tipo de coisas? E se acontecer, que medidas deverão ser tomadas? Não vi nada disso discutido. Pelo contrário, notícias de longos minutos na descrição do que se passou aos olhos de cidadãos que viram da esquerda, da direita, a 100 metros, do fundo da rua. Isto não interessa. Mais uma vez, em Portugal, perdeu-se uma boa oportunidade para discutir o que de facto interessa. É para isso que queremos a RTP?
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